Ó bendito o que semeia livros, livros à mão


cheia... e faz o povo pensar!
O livro caindo n'alma é germe que faz a palma, é


chuva que faz o mar!


Castro Alves


domingo, 17 de fevereiro de 2013

Quem Tem Culpa no Cartório?

Como complementação do post Como posso provar que eu sou eu? - http://diariodacoordenacao.blogspot.com.br/2011/09/como-posso-provar-que-eu-sou-eu.html  fiquei contente em encontrar uma pessoa notória com o mesmo conflito que eu, olhe a crônica de Mário Prata, que curiosa!!!

 Quem Tem Culpa no Cartório?

Vender um carro não é tão difícil assim. O problema é que agora inventaram que a gente tem de ir ao cartório. Assinar lá aquele papelzinho e o sujeito reconhecer a firma da gente. Não adianta mandar ninguém. Tem de ser a gente.

Pois é. Vendi o meu carro e lá fui eu, na quarta passada, reconhecer a minha firma, palavra pomposa para a nossa humilde assinatura. Assinei na cara do sujeito e entreguei. Me pediu a carteira de identidade. Meu Deus, esqueci. Tento quebrar o galho.

— Sem a carteira de identidade não tem possibilidade.

— Meu amigo, está chovendo, foi uma luta estacionar o carro e...

— Impossível. O senhor não viu escrito ali?

Foi quando eu me lembrei do Estadão que estava debaixo do braço. Minha coluna, minha foto. Mostro para ele.

— Está vendo? Sou eu.

Olhou para a foto, olhou para mim.

— Reconheceu?

— É, reconheci. Mas, para reconhecer a firma, só com a identidade. É lei, olha a fila, meu senhor.

— Meu amigo, a carteira de identidade é para provar que eu sou eu, não é? Pois eu acabo de provar que eu sou eu. Ou não?

— Eu sei que o senhor é o senhor, mas não adianta. Olha a fila.

— Posso falar com o seu chefe?

— Não vai adiantar. É aquele. O de peruca. Seu Wilson.

Caminho na direção do seu Wilson. De longe, já começo a analisar a peruca dele. Peruca de homem, não sei por que, sempre me fascina. Me dá uma vontade quase incontrolável de arrancar, de fazer com que todo mundo em volta ria.

Vou olhando em volta. O cartório evoluiu muito. Agora está cheio de computadores. Tá "muderno". Numa mesa a Dulce, a Dudu e o Ferreira (gripadíssimo) dominam o computador para, logo em seguida, bater o carimbo. O carimbo! Céus, quando é que o burocrata vai livrar-se do carimbo? Fico olhando o trabalho da Dulce enquanto o da peruca atende uma senhora de laquê, muito nervosa. Conto: a Dulce bateu 93 vezes o carimbo em um minuto.

Isso é que é funcionária! Mais ou menos uma e meia carimbada por segundo. Está noiva, a Dulce.

Seu Wilson era inteirinho cinza. Ia do cinza claro do terno até o cinza escuro da olheira. Seu Wilson estava conversando com a de laquê, me olhando de lado. Chega a minha vez. Ele:

— Conheço o senhor de algum lugar. O senhor já não foi no programa do Jô?

— Meu nome é Mário Prata e...

— Claro, do Estadão. Reconheci o senhor assim que vi o senhor entrando. Qual é o problema, Marinho?

Odeio que me chamem de Marinho. Mas como havia sido reconhecido, tudo bem.

— É o seguinte, seu Wilson. Vim reconhecer a assinatura da venda do carro e não trouxe a carteira de identidade e...

— lh...

— Mas como o senhor me reconheceu, pode reconhecer também a minha assinatura.

— É, mas só que, pra reconhecer a assinatura, eu preciso da sua carteira de identidade. É uma questão legal.

— Legal, né?

Sentei.

— Seu Wilson, acompanhe o meu raciocínio.

— Pois não.

— O senhor precisa da minha carteira de identidade para ter certeza de que eu sou eu, não é isso?

— Exatamente, Marinho.

— Mário, por favor. Mário Alberto Campos de Morais Prata. Então, continuando, se o senhor sabe que eu sou eu, acho que a gente podia deixar a carteira de identidade pra lá.

— Veja, Mário Alberto (piorou!), quando o decreto saiu no Diário Oficial...

— Tudo bem, tudo bem. Mas me diga, seu Wilson: quem sou eu (aliás uma pergunta que me tenho feito muito: quem sou eu)?

— O senhor é o Mário Prata.

— O senhor reconhece isso?

— O senhor está querendo me pegar, não é? Olha, Campos, agora não posso mais. O meu funcionário, entende? Eu não posso passar por cima dele, tirar a autoridade dele. Se o senhor tivesse me procurado antes, aí sim, talvez...

Fiquei me segurando para não arrancar a peruca dele e colocar fogo. Estava com o isqueiro aceso. Acendi o cigarro, pensei no meu avô Mario que tinha cartório em Uberaba. Pensei em Jesus pensando nos pobres de espírito, pensei no Brasil, pensei na mãe do seu Wilson, pensei que eu não era mais eu.

Liguei para a Isabela, que ia comprar o meu carro.

— Isabela, desisti. Descobri que eu não existo, Isabela.

E fui para o divã do dr. Leonardo Ramos, que tem de carimbar a receita para que eu possa comprar Lexotan.

Ikävää

O amor pelo registro e análise das palavras são intrínsecos a mim. SAUDADE, que entre os finlandeses é conceituada como "ikävää" = tristeza por estar longe de um lugar", representa bem meu sentimento pelo distanciamento em que me encontro sobre este diário. Há um ano e pouco sem postar algo, justifico tal ausência motivada por tantas transformações em minha vida profissional e pessoal. Já afirmei em postagem antiga que a metamorfose é positiva, segundo minha concepção, ao ser humano: implica transformação, evolução, incômodo, desafio, insegurança momentânea etc. É é justamente esse processo por qual passei - de forma mais turbulenta - e ainda passo, mesmo que gradativamente se acomodando, porém, com características ou acontecimentos a serem assentados, que me manteve ausente. 
Obviamente, nunca deixei de escrever ou analisar uma leitura, mesmo minhas próprias produções. Como formadora de professores, a leitura e pesquisa é uma constante em minha vida e foi reforçada, logo após minha saída da coordenação pedagógica de unidade escolar de Educação Infantil. Junto à estes acontecimentos, assumi uma especialização em Protagonismo Juvenil - USP, cujo trabalho está em processo de finalização e pouco tempo depois, o mestrado em Linguística, em pleno processo de pesquisa e estudo. Cursos sequenciais na Escola da Vila, Prisma  Centro de Estudos, eventos breves como palestras e ciclos também foram uma constante durante este tempo.
Em paralelo, minha vida pessoal sofreu uma evolução, o que favoreceu minha disposição para tantas atividades e ações, especialmente quanto ao investimento em mim mesma e em minha família.
Ora pois! A vida ligada no 520w me agrada dada a intensidade, a plenitude da vida, ainda que necessite de equilíbrio para evitar um tilt, um bug mental. Então, enquanto não retomo este espaço, uma vez que tenho o mestrado e outros estudos como prioridade, mantenho este espaço "adormecido", com o anseio de retomá-lo, tão breve possa.